La Condamine na Amazônia, entre mitos e Luzes
A missão geodésica da Académie des Sciences (1735-1744)
Munidos de telescópios, quadrantes e compassos, um grupo de viajantes, na maior parte membros da Académie des Sciences, chega a Quito, nos confins da fronteira amazônica entre o vice-reino do Peru e o Brasil, e ali instala um laboratório a céu aberto. Alguns anos depois, mapas, relatos de viagens, anais oficiais, correspondências, relatórios, toda uma batelada de impressos resultam desta expedição que suscita uma curiosidade e uma celebração sem precedentes. A posteridade vai conservar, sobretudo, o nome de um sábio que soube fazer da ciência um espetáculo, brilhando nos salões e propagando os relatos científicos: Charles-Henri de la Condamine (1701-1774).
Os cientistas participavam de uma missão geodésica que deveria medir um grau de um arco de meridiano sobre a linha equatorial, a fim de determinar se a terra era perfeitamente esférica ou se achatada nos pólos. A primeira hipótese era defendida por Cassini, a segunda por Newton. A exatidão de tais medidas era fundamental para o conhecimento do globo e para a cartografia. Paralelamente, uma outra missão, confiada a Maupertuis partia para a Lapônia; e rapidamente confirmou as suposições newtonianas (1736-1738).
La Condamine, jovem acadêmico apoiado por Voltaire, ingressou na missão do Peru junto com os astrônomos Louis Godin e Pierre Bouguer, o botânico Joseph de Jussieu e outros colaboradores. Esta missão conheceu uma sequência incrível de peripécias: inclemência do clima, desconfiança das autoridades locais, assassinato e processo, querelas internas; destino trágico de alguns membros; polêmicas eruditas. De uma duração insólita, ela abriria uma página nova da era dos Descobrimentos, e seus resultados desencadearam um verdadeiro furor crítico.
“Se um dia existiram Amazonas no mundo, foi na América”
Em 1743, La Condamine se separava de seus companheiros e decidia voltar para a Europa descendo o Rio Amazonas. Do forte brasileiro de Pará, ele alcança Caiena, antes de embarcar para a França em 1744. Esta expedição da Amazônia, da qual ele publica o relato um ano mais tarde, é uma etapa decisiva para o conhecimento.
Grande leitor e espírito curioso, o acadêmico ganha as águas munido de um baú cheio de informações antigas e testemunhos recolhidos sobre os lugares (Heriarte, Gomberville, Samuel Fritz...). Confrontando arquivos e observações, ele fará surgir uma profusão de elementos que vão enriquecer a Encyclopédie e reforçar sua reputação de homem de ciências. Os estudos realizados dizem respeito aos domínios da astronomia, cartografia, física, hidrografia, botânica, zoologia e medicina. A representação gráfica do Amazonas, que acompanha seu relato, liquida com os mapas antigos. É a primeira súmula séria, baseada em medidas, do curso do rio. Ele destaca a comunicação da bacia do Amazonas com a do Orénoque através do Rio Negro, versão abandonada nos mapas anteriores, e que logo foi confirmada experimentalmente por Humboldt. La Condamine se interessa ainda pelas espécies animais e vegetais desconhecidas, recolhe espécimes, se informa sobre as propriedades e os usos de sucos, extratos e resinas (curare, quinino, borracha...). Em relação ao lado humano, contudo, o quadro que faz é alimentado por preconceitos: os índios são julgados insensíveis, apáticos, estúpidos, preguiçosos... Esta visão de um homem entregue à natureza, e não muito diferente da “besta”, vai suscitar uma multiplicidade de leituras e de reações, tanto na América quanto na Europa, sobre a influência dos trópicos.
La Condamine investiga também a existência das Amazonas, o local do lago Parimé ou da região mítica do Eldorado, lendas fascinantes veiculadas por relatos de viagens e mapas dos séculos XVI e XVII. Seu sucesso, porém, é relativo, já que tudo parece “ter desaparecido como em um palácio encantado”. Ele é simpático à ideia do Eldorado fundado na voracidade dos europeus e no “gênio mentiroso” dos índios. As guerreiras bélicas e suas pedras verdes, porém, fazem-no ainda sonhar e o seu relato vai perpetuar o imaginário relativo às Amazonas.
A inextricável selva
A formidável documentação produzida abre a América ao teatro da ciência. Outras grandes expedições seguirão. A Amazônia se torna um laboratório de estudos e um terreno de interesses econômicos, coloniais e territoriais.
O mergulho no labirinto de lagos, florestas e rios relança também uma nova forma de romanesco afastada das construções míticas. Charles-Henri de La Condamine pediu o testemunho de um dos membros da expedição, o Sr. Godin des Odonais, cuja esposa Isabel naufragou no inferno verde. Esta odisséia cruel, eco distante do furor de Aguirre, viria consagrar o tema da inextricável selva