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Bataclan: chinoiserie franco-bresilienne.
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Correio das modas: jornal critico e litterario
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Nitheroy.
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Revue des Deux Mondes.
Passagens oceânicas:
A revista Nitheroy & a Revue des Deux Mondes
Nascimento de uma nação
Em 1836, Eugène de Monglave saúda com entusiasmo o primeiro número de uma revista lançada em Paris por um grupo de jovens brasileiros e destinada a seus compatriotas do outro lado do oceano. Se Nitheroy. Revista brasiliense – Sciências, Lettras e Artes teve uma existência efêmera — dois números —, esta aventura editorial foi um acontecimento.
Com a epígrafe “Tudo pelo Brasil e para o Brasil”, e sob o comando de Domingos José Gonçalves de Magalhães (1811-1882), que no mesmo ano publica na França o seu emblemático Suspiros poéticos e saudades, o grupo de Paris lançava um verdadeiro manifesto e abria o Brasil ao nacionalismo e romantismo literário. Na capital francesa, intelectuais ligados entre si por meio de seus estudos e movidos por um mesmo sentimento de pioneirismo, descobrem a revolução estética, bebem nas fontes românticas e convivem com homens cuja influência é decisiva (Ferdinand Denis, Eugène de Monglave, Jean-Baptiste Debret…). Destes encontros vão nascer programas combativos incitando a sacudir a poeira portuguesa e a caminhar em direção a um futuro onde o amor da pátria, a liberdade e a independência, o progresso e a civilização alimentarão de um mesmo sopro o indivíduo e a nação, a pena e o espírito. Sob essa perspectiva, o ensaio sobre a literatura assinado por Magalhães, marcado pelas leituras de Madame de Staël, Chateaubriand e outros autores, é fundador: ele alia expressão original e dever patriótico, ao mesmo tempo em que apresenta o Brasil como “o filho da civilização francesa”. Seus companheiros — Manuel de Araújo Pôrto Alegre (1806-1879), Torres Homem e Pereira da Silva — fazem valer as mesmas aspirações nos domínios das artes, das ciências e das letras.
Esta identificação de uma cultura feita de rupturas, de reapropriações de um patrimônio, de forças de expressões e de inspirações novas conjuga fatores locais e sugestões externas. As influências de tais bases teóricas perduram, e várias personalidades vão explorar estas vias inovadoras na literatura — Gonçalves Dias (1823-1864), José de Alencar (1829-1877) —, nos campos historiográfico e político. Outros órgãos consolidam o grito romântico. A Minerva Brasiliense, um fórum para a literatura, é lançada em 1843 por Pôrto Alegre e Torres Homem. No mesmo ano os dois fundam a Lanterna Mágica, primeiro periódico ilustrado com caricaturas; em 1849, é com o romancista Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882) e o poeta e dramaturgo Gonçalves Dias que Pôrto Alegre, personalidade fora do comum, cria a revista Guanabara.
Em suma a revista consagra um espaço de criação e de difusão de ideias, estimula debates, alimenta a vida intelectual e marca a formação de uma intelligentsia.
Conhecimentos e zonas de turbulência: A Revue des Deux Mondes
Uma outra publicação vai animar o diálogo transatlântico: a Revue des Deux Mondes. Fundada em 1829, ela tratou de questões convergentes no domínio das letras, da história, das ciências, da economia e da política; seu polo de influência foi considerável. Distribuída no Rio, São Paulo e em Recife, ela é lida, requisitada, frequentemente debatida. Abrindo uma tribuna internacional, ela permite o acesso aos escritores mais prestigiosos, seduz por sua curiosidade em relação às sociedades antigas e modernas e por seu espírito crítico. Durante seu período de ouro (1830-1880), o Brasil é centro de atenções: cerca de quarenta artigos lhe são consagrados. Os viajantes são de imediato postos em evidência com artigos de Ferdinand Denis, de Auguste de Saint-Hilaire, as memórias de Lacordaire, os relatos de Francis de Castelnau… Testemunhos ainda impregnados de exotismo, as narrações que dão conta de missões científicas, assim como informações e estatísticas extraídas de publicações brasileiras, alimentam balanços, feitos a intervalos regulares de 1844 a 1873, que provocam por vezes enérgicas reações.
A data de 1844 marca assim uma virada, com a polêmica opondo Pôrto Alegre ao jornalista Louis de Chavagnes que havia estigmatizado a indolência dos trópicos e chamado a civilizar uma população perdida. Em sua réplica (Minerva brasiliense), o antigo discípulo da Missão Francesa debocha dos preconceitos dos viajantes e da arrogância estrangeira, reivindicando inteiramente a diferença americana.
Outros artigos impressionam por sua fineza, como o arrazoado contra a escravidão, Le Brésil e la colonisation, de 1862. Sob pretexto de resenhar impressões e relatos de viajantes, Élisée Reclus, geógrafo anarquista, analisa a situação dos escravos no Brasil e nos Estados Unidos. Sua recensão audaciosa traz o germe da interpretação do Brasil de dois ensaios maiores publicados no século XX (Casa Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, de 1933, e Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, de 1936).
Assim, inúmeros textos informam sobre a diversidade brasileira, detêm-se nos acontecimentos políticos, se debruçam sobre o tráfico ou os negócios ligados à Guerra do Paraguai, que são severamente julgados.
Olhares cruzados
Um duplo “olhar afastado”, conforme a expressão de Mario Carelli, inaugura o século XIX brasileiro e tece os laços culturais entre a França e o Brasil, feitos de admiração mas também de fricções. Passadores, tradutores e autores ratificam o lugar do modelo francês como fonte de influências mas também de controvérsias. Os temas dos trópicos (exaltação da natureza e indianismo) são respostas às expectativas europeias, especialmente francesas; e a reivindicação nacional, política e literária, avizinha-se por vezes da acusação de demarcação, e mesmo de macaquice de um novo senhor colonial por parte do filho tropical. Uma efervescente galofilia, e seu contraponto, marcam de fato as relações, como demonstra Leyla Perrone-Moisés. O poder de sedução da França oscila em função do interesse dado à busca de uma especificidade, ou diante de apostas mais ambiciosas, pan-americanistas. Vê-se isso nos temas e autores escolhidos, no debate em torno da brasilidade, do original e da cópia, dos gêneros e da língua.
Uma terceira margem
É desde uma terceira margem que um autodidata, sem nunca ter saído do Brasil, vai dar a conhecer um ensaio definitivo: “Instinto de Nacionalidade. Ensaio sobre a literatura brasileira”, de Machado de Assis (1839-1908), é publicado em 1873 em O Novo Mundo, um periódico dirigido em New York por um brasileiro. O antigo jornalista prepara o terreno para a compreensão das obras, aborda as tensões dos tropismos coloniais ou novamente subalternos. Seu olhar desobrigado lhe permite ir ao centro dos conflitos entre cosmopolitismo e insularidade, equilibrar dialeticamente os dois termos abrindo o gênio do local ao universal.