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Victor Hugo
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Ribeyrolles, Charles. Brazil Pittoresco, 1861.
Chansons des rues et des bois
Gare
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Les Travailleurs de la mer
Victor Hugo e o Brasil
As relações entre Victor Hugo e o Brasil foram dissimétricas. Se por um lado o poeta francês irradiou seu brilho sobre a cultura brasileira no século XIX, por outro o Brasil não é muito presente na obra de Hugo, onde vai aparecer de forma tardia.
Porém o escritor não ignorou totalmente um país do qual ele ouviu falar através de Charles Ribeyrolles, companheiro de exílio em Jersey e autor, em 1859, de um Brazil pittoresco. Uma das primeiras referências àquelas terras distantes se encontra na coletânea Chansons des rues et des bois, de 1865. Nesse volume há um conjunto de 21 textos, intitulado « L’éternel petit roman », que faz o relato de um amor passageiro, das primeiras turbações do coração até o esquecimento final. Sobretudo oito poemas, nesse conjunto, evocam uma certa Rosita Rosa — nome atrás do qual se esconderia uma conquista do autor — vinda de « ce Brésil/ si doré qu’il fait du reste/ de l’univers un exil » (Gare !). Descobre-se, um ano mais tarde, uma breve alusão às « dames brésiliennes » de « Rio-Janeiro » em Les Travailleurs de la mer. Enfim em 1884, um ano antes de sua morte, Hugo vai se regozijar com a abolição da escravatura no estado do Ceará, em um discurso lido durante um banquete presidido por Victor Schoelcher. Um ano antes, ele teria redigido um poema celebrando « le vaste Brésil aux arbres semés d’or », que será publicado apenas em 27 de fevereiro de 1902 no Jornal do Brasil — mas esta atribuição não é garantida.
Essas poucas marcas na obra hugoliana não dão conta da influência do poeta na vida cultural do Brasil durante o século XIX. Desde os anos 1830 seus textos são publicados, traduzidos e discutidos no seio das elites intelectuais. No Rio, o Jornal do Commercio publica alguns dos seus romances em folhetim. Os escritores brasileiros se reconhecem na veemência de Victor Hugo, em sua retórica apaixonada, suas imagens fortes, suas antíteses vigorosas e em seu ritmo característico. Encontramos estes impulsos poéticos e este fôlego épico nos românticos, principalmente nos que se agruparam em torno do Condoreirismo, movimento cujo símbolo é o ocndor, pássaro majestoso que voa alto e vê longe. Estes autores aderem à visão hugoliana da História, a sua mística do Povo e sobretudo ao papel messiânico do Poeta, porta-voz e mesmo guia da Nação rumo ao Progresso, à Justiça e à Liberdade. Na metade do século, a influência de Victor Hugo é onipresente na literatura: epígrafes, citações, traduções. É o poeta Gonçalves Dias, por exemplo, que traduz Bug-Jargal, ou ainda o romancista Machado de Assis que se encarrega de Travailleurs de la mer. A tal ponto que se pôde falar de “hugoanismo” para caracterizar estas múltiplas manifestações. Sua fama até mesmo ultrapassa os limites da literatura: uma era, Maria Tudor, é composta por Carlos Gomes entre 1874 e 1878. O mais emblemático destes turibulários é Castro Alves, cantor ardente da liberdade, a quem se acusou de ser mais “hugólatra” que brasileiro, às vezes no limite do plágio (cf. suas Palavras de um conservador).
Nos românticos o combate literário se confundia com o combate político e social. Paris representava então para os brasileiros um lugar utópico onde se vivia os ideais da Revolução Francesa, da qual Victor Hugo, após seu engajamento e, depois, seu exílio político, era o profeta. É siginificativo que os livros mais reeditados nesta época tenham sido Les Châtiments, Histoire d’un crime et Napoléon le Petit. A luta dos artistas pela república e contra a escravidão estava em sintonia com os escritos de Hugo. O próprio imperador do Brasil, Dom Pedro II, cujos ideais esclarecidos se chocavam com os interesses dos proprietários de escravos, fez questão de render homenagem a Hugo quando de sua passagem por Paris em 1877 (ver « Visite au poète français »).
A fascinação brasileira foi particularmente visível na morte do escritor. Mas mais que o poeta ou o dramaturgo, os brasileiros saudaram o arauto da liberdade que foi, para eles, Hugo. Nesta ocasião o jornalista Muci Teixeira publicou Hugonianas, uma compilação de homenagem retomando 107 poemas de Victor Hugo traduzidos por alguns dos maiores escritores daquela época (Castro Alves, Gonçalves Dias, Casimiro de Abreu, Vicente de Carvalho, Artur Azevedo, etc.). Mas esta fermata foi tamém o canto do cisne da influência hugoliana. Uma vez a escravidão abolida e a república proclamada, a modernidade se situava do lado da corrente realista. E pouco a pouco a atração por Hugo declinou.
Nos dias atuais, como dá provas, por exemplo, o Simpósio Internacional Victor Hugo que aconteceu em julho de 2002 em Belo Horizonte, o autor francês — cuja notoriedade junto a audiência popular é regularmente reavivada por meio de novas adaptações — permanece, para o público culto brasileiro, uma figura de referência do pensamento humanista.